22 de março de 2008

O Coração na Boca

Acabo de rever "Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças".
E o diálogo final fala mais que eu poderia dizer sobre meus próprios arrepios:

Joel - Eu não entendo o que aconteceu. Eu não vejo nada em você que eu não goste.

Clementine - Mas você vai ver.

Joel - Eu não me importo

Os dois correm brincando na neve. Vão se apagando no fundo branco. Música: "Everybody´s gonna learn sometime" do Beck.

Fim

18 de março de 2008

O dia em que a Alzira quase explodiu

Pensou que estava ôca, a Alzira. Mas tinha um bateria dentro do coração e um multiprocessador no estômago. Ali bem perto das orelhas tinha amplificadores de alta tecnologia que faziam ecoar tudo o que vinha do mundo exterior (lugar-tão-alheio). Tinha um circulador de ar barulhento e enferrujado no peito. Tinha uma lupa nos olhos, tudo era pesado, tudo era intenso, tudo era mais forte do que ela. Tinha amídalas hipertróficas, mas comia feito uma draga. No esôfago, Alzira tinha um moedor de carne. Seus dedos eram tortos, roídos. Alzira estava atulhada de tudo que havia de pior. Queria espirrar toda a sujeira, vomitar os sentimentos que não serviam, queria expelir seu mal. Então, quando se viu perfumada numa destas tardes calmas de abril - como numa cena de filme em paisagem tropical - Alzira quis explodir suas vísceras. Ficou tão afoita que deu um imenso grito pra dentro. Não havia espaço algum. Alzira fora obrigada a acreditar que a vida ôca não passava de uma ilusão. Sabia tão pouco de si, a Alzira.

12 de março de 2008

Ficção não é Mentira

Fico puto quando as pessoas dizem que somos atores na vida. Ator é uma profissão, vamos combinar isso. Uma profissão difícil e decente como muitas outras. Mas sob o argumento de que o ofício do ator é o fingimento, algumas cabeças pouco esclarecidas cismam em atribuir seus fingimentos do cotidiano à boa e velha arte da vida. "A vida não é uma arte, é uma cópia mal feita da arte", não lembro quem disse isso, mas boto fé! A diferença - se é que dá pra ser tão objetivo - é que a arte lida mais com a ficção do que a vida. Na vida há mais representação, mais fingimento. Na arte, a busca é sempre por algo verdadeiro, orgânico, vivo, sincero, dentro de uma lógica que se supõe ser fictícia (quase sempre). O cotidiano é o espaço do fingimento, e atuar não é fingir, é ser o que se é de verdade, por isso, é tão difícil atuar bem. Sempre gostei de dizer: "não atuo nas horas vagas. Quando paro de trabalhar eu sou eu mesmo"... já não concordo mais com isso. Acho pura besteira de ator babaca. Acho que no cotidiano, nessa vida maluca de múltiplas funções, papéis, âmbitos, etc, fingimos mais, somos falsos mesmo. Maus atores. A ficção que se põe em cena busca por meio do ator ser sempre uma verdade e a verdade que representamos no cotidiano é quase sempre mentira. Eu finjo que estou preocupado com tudo, que sou simpático, que me acho atraente, que estou seguro, que adoro a minha vida, que sou inatingível. Você alguma vez já foi minha platéia, mesmo que eu não soubesse. Mas, me desculpem: eu finjo mal. Eu choro escondido, eu tenho medo de ficar sozinho, eu não sei dizer o que eu penso, eu atraso o abraço e perco a chance de um contato real, eu perco chances de dizer as coisas certas porque tenho medo me verem mesmo, eu preciso que me digam o quanto eu sou legal, o quanto eu sou útil. Eu sou uma mentira bem fuleira. Nem eu mesmo me convenço. Quando atuo por ofício, acho que consigo ser melhorzinho. É que eu preciso da boa ficção pra tentar ser real.

6 de março de 2008

Nota de Rodapé

Eu já disse que não sou workaholic... eu sou pobre... é bem diferente...

Era isso!